Tendo discernido em Padre Pio um excepcional carisma para o acompanhamento espiritual, seus superiores submeteram à sua apreciação as dificuldades que encontravam no discernimento dos caminhos de Deus para certas almas. Impressionados por sua lucidez e pelos conselhos judiciosos que lhes prodigalizava, encaminharam-lhe fiéis que eles mesmos dirigiam. Ele tornou-se assim o iniciador de uma verdadeira escola de espiritualidade, cujos membros não pararam de se multiplicar, devido à expansão nos círculos próximos da Ordem dos Capuchinhos de sua reputação de sábio confessor. Não se contentando com simples orientações pontuais, eram cada vez mais numerosas as pessoas que, buscando uma verdadeira continuidade na direção, dirigiam-se a ele, certas de que se doaria sem reservas: como não exercia um ministério assoberbado, tinha tempo — e o usava — para escrever-lhes com frequência e longamente.
A primeira de suas filhas espirituais foi Donna Raffaelina Cerase, uma terciária franciscana de Foggia. Provinha de uma família abastada, inteligente e cultivada, levava com sua irmã Giovina uma existência retirada. Ambas dividiam seu tempo entre a oração, a cooperação com a Ação Católica e a leitura. O Padre Agostino, que conhecia bem as duas irmãs, recomendou-as às orações de Padre Pio em 1913, quando elas tiveram que enfrentar penosas dissensões familiares, e depois que superar a provação do suicídio de um primo. As palavras de reconforto e encorajamento que lhes foram transmitidas da parte de seu jovem confrade foram seguidas, a pedido de Raffaelina, de uma correspondência epistolar, ao longo da qual ela colocou-se sob sua direção, tirando dela muito proveito para seu crescimento espiritual.
A correspondência não foi das mais fáceis. Cada um deles tinha seu temperamento e uma viva sensibilidade, e neles se encontravam — e às vezes se afrontavam — dois universos diferentes da aristocrata de Foggia, que governava sua casa, e do jovem sacerdote, vinte anos mais novo, que desprezava todo preconceito de ordem social e só tinha em vista o bem das almas, a seus olhos todas iguais, tanto as dos servos quanto as de sua senhora. Num primeiro momento ele esforçou-se para afastá-la da ascendência, inegavelmente benéfica, que exercia sobre as mulheres de sua casa, e igualmente sobre as amigas que partilhavam de suas aspirações à vida perfeita. Não que reprovasse essa influência: pretendia simplesmente purificá-la de qualquer complacência, de um certo autoritarismo involuntário, que, sem que ela o quisesse, entravava a liberdade espiritual dessas almas…
Ao longo de uma substancial correspondência, ele conduziu Donna Raffaelina a desapegar-se de seus últimos laços com o mundo. Ela resistiu um pouco — era então algo culpável gostar ainda dos livros modernos, eufemismo com que designava as leituras frívolas? —, depois abandonou-se às exigências de uma direção espiritual que ela mesma tinha desejado:
O senhor encontrará sempre em mim uma confiança inalterável, imutável e filial, ao expor-lhe o que vivo interiormente, ao relatar as circunstâncias mais ou menos a me converter […] Suas cartas recordam-me meu dever. O senhor faz bem, faca-o sempre, tem para isso o direito e toda autoridade: não me poupe. Peço-lhe que não me abandone. Sou sempre a mesma, confiando-me ao senhor sem reservas […] Meu pobre espírito tem constantemente necessidade do senhor, quando a luta se torna áspera, quando a alma está fatigada, abatida, mas também quando o espírito goza de uma relativa calma: em casa ou na rua, aqui e ali, sempre e em todos os lugares, suas santas palavras me dão força, luz e consolação.
…. Com uma extrema solicitude, Padre Pio preparou sua filha espiritual para a morte que, muito serena, ocorreu ao alvorecer do dia 25 de março de 1916, na festa da Anunciação.
Livro: Das sanções do Santo Ofício ao esplendor da verdade
Joachim Bouflet
Página 195
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