Certas histórias relacionadas com o padre Pio – escreve Ryska – tocam os limites da novela ou do romance policial. São histórias que, como disse alguém, envergonham no senso comum, mas ao mesmo tempo satisfazem as nossas ideias sobre a existência de um outro mundo. Temos um exemplo nesse relato da biógrafa Catarina Tangari, que foi a protagonista.
Um advogado livre-pensador alugava cabanas para veranistas nos montes avelinos. Tinha lá uma vila cercada de um magnífico jardim – tão deslumbrante que dava a impressão de ter saído direto das mãos de Deus. Mas essa impressão se desfazia ao ler junto ao portão de entrada, numa placa de cerâmica: “Nesta casa não se fala em religião”.
Naquele dia o advogado saudou cortesmente o grupo que se dizia interessado por uma cabana. Ele, claro, não sabia que estavam ali chegando de San Giovanni Rotondo e se encontravam ainda sob a forte impressão do padre Pio. Catarina, fazendo de conta que não vira a placa, tentou direcionar a conversa para questões religiosas. E como ela também era apaixonada por flores, começou ali. O advogado, feliz por vê-la interessada com o assunto, abriu o coração:
– Estou velho, já não me resta muito tempo de vida. Mas tenho estas flores, que são minha única alegria… Quando penso que terei de me separar delas, fico meio desesperado – acrescentou comovido.
Em seguida, em tom de brincadeira:
– Por isso fiz um pacto com o diabo. Já que na vida procurei servi-lo da melhor forma, espero que, depois da morte, me permita visitar muitas vezes o meu jardim.
– Quer dizer que o senhor deseja ir para o inferno?
– É claro. Sabe, com o diabo, o sempre me dei bem.
A revelação era chocante, mas a interlocutora não se deixou abalar
– Creio que, mais do que com o diabo, o senhor se dá bem com suas flores, não é mesmo? – observou ela, o que comoveu ainda mais o velho livre-pensador.
No seu interior ela pensava: se alguém acredita no diabo, no inferno, na vida além-túmulo, deve estar próximo da fé em Deus, no céu, na alma imortal. Este homem pensa assim porque simplesmente não encontrou Cristo. E ali está a raiz de todo problema dele.
Seu pensamento voou para padre Pio. Ele costumava sair-se muito bem com casos desse tipo. Como, porém, motivar o advogado a visitar San Giovanni Rotondo? Interiormente rezava e pedia algum sinal. Decidiu então que se ele lhe oferecesse uma flor, iria a San Giovanni Rotondo só para colocá-la diante da imagem do Coração de Jesus. E pedir ao padre Pio uma intenção em suas orações por esse homem.
Para espanto e alegria de todos, o advogado, que não costumava dar suas flores a visitante algum, na despedida ofereceu-lhe um buquê de rosas.
Da parte de Catarina isto incluía ir ter imediatamente com padre Pio. E foi. Falou-lhe no ocorrido e pediu uma intenção especial na Missa do dia seguinte, o que ele prometeu. Em seguida, ele benzeu um santinho do Sagrado Coração de Jesus em um terço, para serem enviados ao advogado, recomendando-lhe que procurasse confessar e comungar na próxima Páscoa.
Catarina, porém, ficou em dúvida: não estaria pedindo demais de uma só vez? Essa recomendação de confessar e comungar, mais terço, mais santinho, não acabariam pondo tudo a perder? Mesmo assim enviou o material. E sentiu-se gratificada quando, semanas depois, chegou a resposta: “Bondosa senhora – dizia – lembro-me da nossa conversa e de lhe ter oferecido flores.
Mas não podia imaginar que acabaria me enviando uma cartinha tão simpática e estimulante, que me fez tomar a decisão de receber os sacramentos por ocasião da Páscoa. Esses estímulos, por parte de meus familiares, nunca me faltaram. Embora, intimamente, eu ansiasse pela vida na fé, devo confessar que somente a sua carta me levou a tomar esta decisão. Agradeço pelo presente, pelo bonito terço. Ao rezá-lo prometo me lembrar da senhora”.
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