Outro caso de introspecção foi relatado publicamente por um senhor que acabara de sair do confessionário e que, sem respeito humano, com uma exuberância bem italiana, contava aos que quisessem ouvir seus pecados.
Fora de si de alegria, gesticulando, falando alto, parecia um ator empolgado em representar um papel diante de um auditório improvisado.
– Minha gente – dizia –, ouçam o que aconteceu comigo. Há trinta e cinco anos eu não botava os pés na igreja. Não queria saber nada de Deus, de Nossa Senhora, dos santos. Levava uma vida infernal. Isto mesmo, vivia como um condenado. Lá um dia uma senhora me sugeriu:
– Que tal você ir a San Giovanni Rotondo e falar com o padre Pio?
Garanto que acabaria tomando jeito nesta sua vida de blasfemador.
Achei graça:
– Se pensa que para o seu Padre eu sou um bocado fácil de engolir, se pensa que ele me apanha com a mesma facilidade como aos outros, está enganada – respondi. Mas, no fundo, esta ideia me incomodava, me verrumava como uma broca perfurando a rocha. Por fim disse a mim mesmo: “Afinal, por que não tentar? É a melhor maneira de me livrar desta ideia importuna”.
Pois é, gente, cheguei aqui ontem à noite. Tudo lotado. E eu, que por nada abro mão do meu conforto, não consegui engolir a janta nem dormir direito. Aquilo bagunçou meu coreto. Passei a noite pensando nos meus pecados. Nunca os tinha visto de perto. Era um verdadeiro desfile. Cheguei a ficar coberto de suor. Também com este calor… Pelas duas da madrugada, à minha volta começaram a disparar os despertadores. Dos quartos vizinhos me chegavam seus sons agudos. Trrr… Trrrr… Que podia eu fazer? Levantei na marra, como todo mundo. Tonto de sono, cuspindo palavrões, fui à igreja.
Alguma coisa de inexplicável me empurrava para lá. Esperei um tempão com os outros diante da porta e com eles também entrei depois. Assisti à Missa do padre Pio. Que Missa! Mas eu me defendia tapando os ouvidos para não escutar suas palavras, tudo em vão. Notei que começava a perder terreno.
As orações que ouvia pareciam rachar minha cabeça e eu pronunciava as palavras como um autômato. Depois da Missa, nem sei de que maneira me encontrei na sacristia. Queria ver o Padre de perto, ele e suas chagas. Nisto ele se aproximou e perguntou:
– Não está sentindo a mão de Deus sobre sua cabeça?
– Padre, desejo me confessar! – foi tudo que consegui balbuciar.
– Venha então.
Ajoelhei, mas a minha cabeça estava oca. Vazia como uma panela. Fazia um esforço danado, e não conseguia lembrar um único pecado. Enxergava-os em conjunto, como um lodo viscoso, mas não um a um, como os tinha visto durante a noite. Por onde começar? Vendo-me botar as mãos pelos pés, o Padre me animou:
– Coragem, Filho. Por que se preocupa tanto? Já não me contou tudo durante a Missa? Vamos lá…
Ele mesmo se pôs a enumerar meus pecados, um a um, todos. Até os que havia esquecido. Eu só precisei dizer sim. Por fim, me deu a absolvição.
Agora me sinto leve como uma criança, livre, livre.
– Agradeça à Mãe do Céu! – me disse o Padre na saída.
Boa gente, estou contando isto para que agradeçam a Deus comigo.
Após relatar o fato, Ryska aproveita agora tecer outros comentários sobre a extraordinária arte de se confessar do padre Pio, que “penetrava na alma como a relha do arado penetra na terra. Dissipação as trevas com a violência de um relâmpago, sacudia como um trovão, afundava-se nas consciências como o bisturi do cirurgião cortando os tecido doentes. Abalava e demolida. Só ficava satisfeito ao ver os penitentes vencidos e determinados a começar uma vida nova”.
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